Salve o Jongo, camará!
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Salve o Jongo! Salve os Jongueiros! Salve Vovó Maria Joana Rezadeira! |
Você tem alguma noção do que seria Jongo? Já ouviu falar? Vamos descobrir um pouco da história do Jongo, e de alguns Mestres.
O Jongo
Os negros montam uma fogueira e iluminam o terreiro com
tochas.
Do outro lado, armam uma barraca de bambu para os pagodes, um arrasta-pé onde
os casais dançam o calango ao som da sanfona de oito baixos e pandeiro.
À meia-noite, a negra mais idosa e responsável pelo jongo interrompe o baile,
sai da barraca e caminha para o terreiro de “terra batida”. É hora de acender a
fogueira e formar a roda. As fagulhas da fogueira sobem pro céu e se misturam
com as estrelas. Ela se benze nos tambores sagrados, pedindo licença aos
pretos-velhos – antigos jongueiros que já morreram – para iniciar o jongo.
Improvisa um verso e canta o primeiro ponto de
abertura. Todos respondem cantando alto e batendo palmas com grande animação. O
baticum dos tambores é violento. O primeiro casal se dirige para o centro da
roda. Começa a dança.
Durante a madrugada, os participantes assam na fogueira batata-doce, milho e
amendoim. Alguns fumam cachimbo, tomam cachaça, café ou caldo de cana quente
para se esquentar.
O jongo é muito animado e vai até o sol raiar, quando todos
cantam para saudar o amanhecer ou “saravá a barra do dia”.
Dança-se o jongo no dia 13 de maio, consagrado aos pretos-velhos, nos dias de
santos católicos de devoção da comunidade, nas festas juninas, nos casamentos
e, mais recentemente, em apresentações públicas.
A Dança do Jongo
Os jongueiros dançam muitas vezes descalços,
vestindo as roupas comuns do dia-a-dia.
O jongo é uma dança de roda e de umbigada. Um casal de cada vez dirige-se para
o centro da roda girando em sentido contrário ao dos ponteiros do relógio. De
vez em quando, aproximam-se e fazem a menção de uma umbigada. A umbigada no
jongo é de longe.
Logo um outro entra roda, pedindo licença: “Dá uma
beirada cumpadre!” ou “Bota fora ioiô!” Os casais, um de cada vez, vão se
revezando até de manhã numa disputa de força, ginga e agilidade.
Durante a dança, o casal trava uma comunicação pelo
olhar, que vai determinando o deslocamento pela roda e o momento da umbigada.
No jongo da Serrinha, existe um passo que se chama “tabiá”, uma pisada forte
com o pé direito.
Instrumentos
O
jongo é dançado ao som de dois tambores, um grave (caxambu ou tambu) e um agudo
(candongueiro). O repicar do candongueiro atravessa os vales, avisando aos
jongueiros das fazendas distantes que é noite de jongo.
O Jongo da Serrinha
A vida dos moradores desse morro do subúrbio de Madureira continuou bem parecida com a dos tempos das fazendas. As cachoeiras, os bambuzais, os animais selvagens, as casas de pau-a-pique, o candeeiro e o ferro a brasa continuaram a fazer parte do dia-a-dia. O espírito festivo dos moradores e a consciência da importância de se preservar a cultura negra foram fundamentais para a formação desse núcleo de famílias-artistas. As ladainhas, os blocos de carnaval, os pastoris, as casas de umbanda, o samba de partido-alto, o calango e o jongo da Serrinha ficaram famosos, atraindo a visita de intelectuais, políticos e artistas do outro lado da cidade para suas rodas de samba, festejos, umbandas e candomblés.
Seus moradores lideraram movimentos negros e de luta popular, como a fundação do primeiro sindicato do Brasil, o do Cais da Estiva, onde muitos deles trabalhavam e a fundação das primeiras escolas de samba.A partir da década de 60, muitos velhos jongueiros da Serrinha foram morrendo e, mesmo naquela comunidade, as rodas de jongo começaram a se extinguir. Preocupados com isso, Mestre Darcy Monteiro e sua família convidaram as antigas jongueiras Vovó Teresa, Djanira, Tia Maria da Grota e Tia Eulália para formar o grupo artístico Jongo da Serrinha e quebraram o tabu que impedia as crianças de participarem do jongo.
Grandes Mestres e Mestras do Jongo
Vovó Maria Joana (1902-1986) e Pedro Monteiro
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Vovó Maria Joana Rezadeira |
Maria Joana Monteiro, a Vovó Maria Joana Rezadeira, nasceu em 24 de junho de 1902 na Fazenda Saudade, perto da Fazenda da Bem Posta, em Marquês de Valença, interior do estado do Rio de Janeiro. Quando criança trabalhou em lavouras de arroz, feijão e café.
Ainda criança, trabalhou na lavoura. Aprendeu o jongo na fazenda onde nasceu. Quando seus padrinhos morreram, órfã de mãe, Maria Joana foi morar no Rio com o pai, que também morreu logo depois. Foi morar em Cascadura, trabalhando como ama-seca. Depois de doze anos no Morro da Mangueira, mudou-se para a Serrinha, onde ficou até morrer.
Casou-se aos quatorze anos com o primo Pedro Francisco Monteiro, também jongueiro e cavaquinista. Pedro era carregador do Lloyd Brasileiro e, assim que chegou ao Morro da Serrinha, dedicou-se a trabalhos comunitários, ajudando a fundar a Escola de Samba Império Serrano. Vovó Maria cantava as ladainhas na Serrinha no dia de São Pedro, na casa de Vovó Líbia e Seu Antenor, e na quadra de ensaios do Império Serrano, no dia de São Jorge, antes da saída da imagem do santo para a procissão que percorre as ruas dos subúrbios. Vovó Maria desfilava no alto do carro com a imagem de São Jorge, pois era a mãe de santo mais popular de Madureira.
Dava o jongo em sua casa no dia 24 de junho, dia de São João, e data de seu aniversário. Aos vinte e sete anos, começou a desenvolver sua mediunidade e, após a morte de seu marido, construiu um espaço em sua casa para rituais de umbanda. Seu terreiro, a Tenda Espírita Cabana de Xangô, entrou para a história do Rio de Janeiro. Rezadeira famosa, recebia grande número de crianças e adultos com orações que os livrava de doenças como o “vento virado”, “espinhela caída”, “quebrantos” e outros males. Vovó também era parteira: muitas gerações da Serrinha foram aparadas pelas suas mãos.
Mulher de muito carisma, onde quer que chegasse sua forte presença atraía todos, que logo a cercavam para saber quem era aquela senhora tão simpática e bem vestida, com suas roupas de santo brilhantes, que ela mesma criava e costurava. Vovó dedicava todo seu tempo à caridade, abrindo a sua casa para abrigar os necessitados e oferecer-lhes um teto e um prato de comida. Em intenção a São Lázaro, o Obaluaiê da umbanda, Vovó Maria Joana realizava todos os anos na sua casa o “Banquete dos Cachorros”, ritual em que uma ceia era servida no chão, primeiramente, para os cachorros da redondeza.
Figura querida e de prestígio, cultivava amizades de artistas, intelectuais, músicos e políticos famosos. Estes, muitas vezes, vinham de longe para se aconselhar com sua ancestral sabedoria e participar dos banquetes regados a muita comida, bebida, partido-alto e jongo. Clara Nunes, que desde moça frequentava sua casa, tornou-se sua filha-de-santo, assim como diversos outros sambistas. Vovó Maria Joana sempre fez parte do mundo do samba. Ex-componente da antiga escola Prazer da Serrinha participou com seu marido, em 1947, da fundação da Escola de Samba Império Serrano, onde desde o primeiro ano desfilou na ala das baianas, além de desenhar figurinos para a escola.
Vovó Maria disse que, quando morresse, ficaria feliz por saber que tinha ensinado o jongo para muita gente e que este não iria mais acabar: “Tudo tem o seu dono. /Nós não somos donos de nada, /Mas o que recebemos temos que passar adiante.” Sua casa, na Rua da Balaiada, 124, no coração da Serrinha — ladeira onde moram as famílias Oliveira, Monteiro e Silas de Oliveira, e local de fundação do Império Serrano — ainda hoje é um núcleo que mantem vivas importantes manifestações da cultura afro-brasileira e ponto de referência para toda a comunidade e seus arredores.
Mestre Darcy do Jongo (1932 – 2001)
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Mestre Darcy do Jongo, filho de Vovó Maria Joana e de Seu Pedro Monteiro |
Darcy Monteiro, o Mestre Darcy do Jongo da Serrinha, nasceu em 31 de dezembro de 1932 na rua da Balaiada 124, Morro da Serrinha. Filho de Pedro Monteiro e Vovó Maria Joana Rezadeira, pertencia a uma das mais tradicionais dinastias do jongo no Brasil, sendo responsável pela perpetuação do jongo na Serrinha até os dias de hoje. Seguindo os passos do pai, Pedro Monteiro, Darcy desde cedo começou a fazer trabalhos comunitários na Serrinha. De uma família de músicos iniciou sua carreira profissional aos 16 anos, tornando-se um percussionista sensacional.
Em 1947, fundou a Escola de Samba Império Serrano, onde introduziu o agogô na bateria pela primeira vez, sendo logo copiado pelas outras escolas do Rio de Janeiro. Mestre Darcy foi fundador — com Candeia, Wilson Moreira e Nei Lopes — do Grêmio Recreativo de Arte Negra Quilombo, e também da primeira escola de samba infantil, a Império do Futuro, sendo filiado à Ordem dos Músicos do Brasil desde sua fundação. Na Rádio Nacional, acompanhou grandes nomes da música, como Geraldo Pereira, Francisco Alves, Jorge Veiga, Ataulfo Alves, Marlene, Emilinha, Herivelto Martins, Monsueto, Mário Reis. Foi coreógrafo e ritmista de um trio de pandeiros no Cassino da Urca, e atuou em diversas casas noturnas da cidade. Viajou para a França, Portugal, Inglaterra, Uruguai e Argentina, participou da Companhia de Carlos Machado e das Orquestras do Severino Araújo, Maestro Guido de Moraes, Raul de Barros e Paulo Moura. Também acompanhou o jazzista Dizzy Gillespie em suas apresentações no Brasil, participou das gravações do disco “Missa dos Quilombos”, de Milton Nascimento, e de discos de cantores como Roberto Ribeiro e Beth Carvalho.
Com sua família e antigos jongueiros, fundou o grupo Jongo da Serrinha, na época chamado Jongo Bassam, a fim de retomar as rodas de jongo e divulgar a tradição. Apresentava-se com a mãe, Vovó Maria Joana Rezadeira, com a esposa, Eunice Monteiro, a irmã Eva, o filho Darcy, a sobrinha Dely, e a jongueira centenária Vovó Teresa, Tia Maria da Grota e Djanira do Jongo. Apresentou-se com o jongo em diversos teatros do Brasil e do exterior. Mestre Darcy além de músico profissional e jongueiro participava como ogã nas atividades da Tenda Espírita de Xangô tocando tambor para sua mãe e irmã.
Muito carismático Darcy era um fenômeno tocando tambor, dançava e cantava muito bem, compôs diversos jongos e sambas, dirigia artisticamente o grupo e era uma lenda viva, um personagem que ligava as novas gerações ao passado musical da cidade do Rio de Janeiro. Dono de uma forte personalidade quebrou três tabus: introduziu instrumentos de harmonia no jongo tradicional, passou a ensinar o ritmo para as crianças e levou o jongo dos quintais da Serrinha para os palcos. Nos últimos anos, Mestre Darcy ensinava o jongo para universitários e estudantes em geral e chegou a participar da gravação de CDs de novos artistas. Ao morrer, em dezembro de 2001, deixou como herdeiro dos toques dos tambores do jongo seu filho Darcy Antônio.
Tia Maria da Grota (1920)
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Tia Maria da Grota (ou Tia Maria do Jongo) |
Tia Maria de Lourdes Mendes nasceu na rua da Balaiada em 30 de dezembro de 1920. Filha do pioneiro Zacarias e de Etelvina, teve nove irmãos que, juntos, fundaram o Império Serrano, entre os quais Sebastião Molequinho,Tia Eulália, Dona Conceição e João Gradim. “Imperianos” das primeiras horas, todos foram criados desde pequenos em ambiente festivo, interessando-se sempre pelo carnaval, pelas festas juninas e pelas pastorinhas. A família sempre foi presença obrigatória entre os sambistas do Império. Tia Maria saiu na Ala das Baianas da agremiação durante toda a vida. Desde pequena, assistia aos jongos e macumbas na Serrinha, embora seja católica praticante. Em 1977, foi convidada por Mestre Darcy para entrar no grupo Jongo da Serrinha. A partir daí, nunca mais parou.
Comadre de Vovó Maria Joana, nasceu na casa em frente à dela. As duas famílias sempre mantiveram fortes laços de amizade e comadrio. Muito respeitada por atualmente ser a jongueira mais antiga da Serrinha, Tia Maria tornou-se a líder do grupo. O quintal de sua casa vive cheio de crianças que passam as tardes brincando, comendo bolo de coco, canjica e sua comidinha mineira deliciosa. Querida por todos, Tia Maria faz lembrar o clima familiar da Serrinha. Nos últimos anos, sua casa tornou-se o local de confraternização do grupo, que ali ensaia e festeja antigas tradições como a feijoada em homenagem aos pretos-velhos no dia 13 de maio, a distribuição de doces de São Cosme Damião no 27 de setembro e as rodas de jongo em seu quintal. De alguns anos para cá, além de dançar maravilhosamente, Tia Maria passou a compor pontos de jongo e a cantar nas apresentações.
Esses Mestres e Mestras são alguns dos Mestres de Jongo. Na página do Jongo da Serrinha possui a história de todos os grandes Mestres e Mestras, acesse: Mestres do Jongo - Serrinha.
Alguns vídeos de Jongo:
Mestre Darcy do Jongo e Vovó
Maria Joana (Mãe e Filho)
Jongo da Serrinha - CD
Conteúdo original do site Jongo da Serrinha. Divulgação pela página Iuna.com, Site da Cultura Africana.